A crise do coronavírus tem tido a aviação como um dos elementos centrais: além de ser um grande meio de propagação, resultou numa briga geopolítica.

Esse enrosco todo que vamos contar começa lá em 1971, quando uma resolução da ONU reconheceu apenas a República Popular da China (RPC) como representante chinesa, mas não reconheceu Taiwan, que também se considera chinesa e se auto-intitula como República da China.
Lembrando que Taiwan declarou independência em 1912 e hoje é considerada como província rebelde pelo governo comunista de Pequim. E, mesmo tendo própria moeda, aporte, aviões com registros diferentes, ainda assim não é considerado um país independente pela ONU, e tampouco pela ICAO (a Organização de Aviação Civil Internacional), que é sua agência voltada para o crescimento ordenado e seguro da aviação mundial.
O vírus da discórdia
E foi aí que começou toda a confusão.
Taiwan quer participar no esforço global para conter o coronavírus, mas a ONU, a ICAO e a Organização Mundial da Saúde (OMS) se recusam a ar informações para o governo de Taiwan, pedindo para que eles se dirijam a Pequim.
Nesse contexto, alguns jornalistas começaram a relatar a falta de colaboração por parte da ONU e suas agências, e alguns deles foram bloqueados pela ICAO no seu Twitter oficial.
Hey everyone, check this out– I’ve been blocked by the International Civil Aviation Organization (@icao), a @UN specialized agency, for assumedly tweeting about the need for Taiwan’s inclusion (not hip) in light of a global health crisis. 1/ pic.twitter.com/yEZur36xvp
— Jessica Drun (@jessicadrun) January 25, 2020
E a ICAO, num símbolo de autoritarismo, subiu o tom na rede social, falando que iria bloquear qualquer pessoa que tivesse comentários considerados como “spam e desinformação”. Naturalmente, boa parte da comunidade aeronáutica começou a criticar a atitude, tendo a maioria sido bloqueados. Mas, então, se descobriu um fato interessante.
Soube-se que a Chefe de Comunicações (e responsável pelas redes sociais) da ICAO é Qining Quang, uma jovem chinesa que se formou em Relações Internacionais numa universidade pública do seu país e depois trabalhou na CAAC – a ANAC chinesa – por oito anos, antes de ir para a ICAO.
This seems pretty relevant. pic.twitter.com/Lhb4YZK8fe
— ??? (@EucWZc1c1lFsQBP) January 28, 2020
Com isso, diversas pessoas aram a acusar Qining de estar bloqueando jornalistas e ativistas pro-Taiwan no Twitter, por estar seguindo ordens do governo chinês. Além disso, a Secretária Geral da ICAO, Fang Liu, também é chinesa e com um background muito similar de Qining, com experiência na CAAC.
The Secretary General of the @icao is Fang Liu, former Deputy Director of the General istration of Civil Aviation of China (CAAC). So, presumably a C lackey.
— ?????? ?????? ?????? ???? ???? ????????? (@the_ice_man_24) January 25, 2020
Incidentally, originally from #Wuhan. pic.twitter.com/Kawo9FmvPI
Alguns membros do Twitter chegaram a chamar a ICAO de International China Aviation Organization, devido a suposta influência da China na agência.
That’s why I called on @StateDept last week to push for Taiwan’s inclusion in the World Health Organization. China’s abuse of multilateral organizations, including @WHO and @ICAO, puts all of us at risk. https://t.co/ESqAI8HbRb pic.twitter.com/1vhREzhuMe
— Ed Markey (@SenMarkey) January 29, 2020
A confusão foi tao grande que Senadores dos EUA como Marco Rubio (REP-FL) e Ed Markey (DEM-MA) foram até o Departamento de Estado de seu país para pedirem providencias para inclusão de Taiwan e fim do bloqueio aos jornalistas.
#China is reportedly not allowing #Taiwan to evacuate its citizens from #Wuhan where the deadly #coronavirus is.
— Senator Rubio Press (@SenRubioPress) January 29, 2020
It is an outrage that the Chinese government is playing politics with people’s lives & public health.https://t.co/EkS9arRHpO
Outro ponto levantado pelos senadores e pelos jornalistas é que Pequim proibiu Taiwan de realizar um voo de evacuação de seus cidadães que estão em Wuhan, cidade epicentro do vírus.
Apos pressões de diversas pessoas e entidades, a ICAO se viu obrigada a mudar sua política de redes sociais. A agência informou que esclareceu alguns pontos das regras que não estavam claros:
Contrary to some claims, ICAO welcomes and *encourages* constructive criticism. We agree that our social media rules should provide more clarity about what we consider unacceptable, and we have updated them: https://t.co/SR1hnWeWoM
— ICAO (@icao) January 30, 2020